Penso em muita coisa ao
mesmo tempo. Esse é o meu problema. Pensar em muita coisa ao mesmo tempo o
tempo todo me faz não parir nada de suficientemente memorável nem nada
satisfatoriamente claro e distinto. Enquanto penso que penso em muita coisa ao
mesmo tempo, já estou pensando em uma multiplicidade de outras coisas. É sempre
tudo tão confuso e nebuloso e obscuro e entorpecedor e arrebatador e... E... E...
Sem perspectiva, sem significado. Só vivo e me sinto imersa até o ultimo fio de
cabelo em cada grão de vivência – em toda e qualquer vivência, da mais abismal
até a mais medíocre. Não sinto falta de quem eu era nem de quem eu tinha. Não sinto
falta do que vivi. Não sinto falta de pessoas que sentem a minha falta. Não sinto
falta de momentos que continham um potencial inquestionável para serem
lembrados eternamente com nada menos do que uma reação emocionalmente intensa
como um arrepio ou uma lágrima. Não sinto falta de mim, e nem do “tu”, “ele”, “ela”,
“nós”, “vós”, “eles” e “elas” que já ousei me tornar. Transitei por incontáveis
mundos, experimentei cada vertente de suas transcendências dionisíacas e cada
pó incômodo intrínseco a cada pingo de deleite. Em cada instante me sinto parte
de um mundo diferente, e a partir das pulsões latejantes que clamam pelo intocável
eu vou vagando como criatura incerta, traiçoeira, fugidia, fria, frígida, ora
prolixa, ora lacônica. A única certeza que me pertence – ou eu pertenço a ela? –
é tão-só a minha necessidade constante de incertezas. Não importa. Agora não
tenho nem cabeça e nem tempo para crises existenciais – embora meu instinto
mais profundo e pulsante e íntimo relute incessantemente em me persuadir a
praticar o oposto do que a minha racionalidade castradora me impôs: esse
instinto que, por algum motivo associado à configuração espaço-temporal da
pulsão de forças, não se determina nesse instante como dominador, possui a pretensão
de me fazer começar desde agora a problematizar esse “agora” (e todos os outros
enunciados por almas profanas).
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